terça-feira, 13 de novembro de 2012

E ENTÃO A CARTA FALOU...



Tracy Marks

A astróloga sentou-se
estacionária
tornando-se retrógrada.
– Cheguei ao nadir da minha vida,
disse. Durante anos,
estive descendo. É hora
de retificar o caminho que tracei,
de diminuir a minha órbita de influência
e de buscar a minha parte da fortuna.

– Vivi
em oposição à vida,
transitei
de casa em casa,
eclipsada por corpos maiores
que ocupavam um espaço
que eu pensei que era meu.
Falei um idioma ininteligível
de signos,
sem aspectos,
anotando aspectos que se entrelaçavam
com os planetas de outras pessoas,
calculando logaritmos
das dores e alegrias de outros,
em órbita ao redor de um sol que não era meu,
observando de longe
cada astro fixo que representava seu drama cósmico,
presenciando a declinação de minhas esperanças.

– É hora – disse –
de dar-me latitude,
de determinar minha direção principal.
Então, cada dia, ela nadou
nos símbolos de sua carta,
imersa nos significados secretos daqueles,
anotando cada cúspide de sua vida,
cada progressão e cada progressão
inversa, buscando uma resposta alquímica
parra suas perguntas.
Mas o mapa falava
com língua balbuciante, frases vagas,
um delirante oráculo de Delfos.

Em vão ela delineava
aspectos obscuros, asteróides ponteagudos,
eclipses, estrelas fixas;
sem resultado, ela tentava
com cosmobiologia e harmônicas.
Cada senda
confirmava somente o diagnóstico,
não dava indícios de cura,
não conseguia descobrir a ferida
sepultada sob cada aflição,
nem transmutar cada quadratura em trígono.
Então, frenética,
traçou livros e tábuas,
voltou-se para o homem a quem ela amava,
em busca de consolo,
saiu em busca da família e dos amigos,
escreveu poemas
durante a noite, prescindindo
de seus sonhos,
até que os primeiros raios matutinos
iluminaram seu escuro lugar.
A manhã despertava nela.
Então, levantou-se e abriu as janelas
de sua décima-segunda casa. Os raios do Sol
a inundaram com seu calor e poder.
Seus olhos beberam nas estrelas sem brilho,
na plenitude da Lua, que se desvanecia.
A astróloga se deteve,
estacionária. Tranqüila. Serena.
E então a carta falou.
– Sou uma carta – disse,
mas não uma bússola. Sou uma orientação,
mas não um guia.

– Em grandes traços, esboço para ti
uma dezena de aspectos, de caminhos
que podes percorrer,
mas só tu deves escolher
o que seguirás,
deves completar sua forma
com as folhas da tua própria experiência.

– Alguns segredos nunca revelarei.
Desvio tua busca,
te frustro,
te obrigo a efetuar tua própria
transmutação,
te forço para que saias
e traves as muitíssimas lutas
da tua vida quotidiana,
para que te permitas um instante
de silêncio ao amanhecer,
e logo te estimulo para que
aprofundes o recôndito da tua alma
até o sol interior
que te sustenta
e permite
proporcionar-te a tua própria
iluminação.

– E ao descobrirás como
o esboço se desenvolve, e como está escrito
todo o mapa.

A astróloga se deteve,
Estacionária, tornado-se direta.
– Com lentes muito finas, contemplei
símbolos misturados – disse ela;
descobri apenas verdades microscópicas,
cega a todas as verdades telescópicas.
Entretanto, em minha vida,
cada oposição
é uma lente de longuíssimo alcance,
uma linha de visão que se estende através
do infinito, duas linhas de energia
que se encontram no centro,
tornando-se uma só.

– Agora, ao amanhecer,
me desloco até o centro da roda;
uno o vazio entre a noite
e o dia, converto-me na arquiteta
da minha alma, renova
cada uma das minhas casas, abro
suas janelas,
transformo a luz
numa corrente de vida com
as energias do novo alvorecer.

– Em minha vida, cheguei
a outro ângulo – disse ela.
Começarei a ascender o horizonte.

Um comentário:

  1. Lindo demais! Que astróloga e mulher sensível! Os astros são o espelho claro onde vês o infinito das pessoas e de ti mesma como o faço com os arcanos... Parabéns! Nossos amores simbólicos (astrologia e tarot) expressam mesmo lindamente o que sentimos e queremos da vida!
    Um grande beijo.
    Com amor Jaime E. Cannes.

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