Da obra "As Grandes Mensagens", do Dr. Serge
Raynaud de la Ferriere, II Mensagem, p. 136.
O termo
intuição, assim como qualquer termo da linguagem humana, tem o inconveniente de
empobrecer e deformar, singularmente, a realidade que representa, e para
designar um conceito novo, apesar de definir estritamente o sentido e delimitar
rigorosamente o seu uso, sempre produz uma espécie de ressonância dos significados
ou das antigas acepções da palavra e a imensa maioria dos homens, cedendo à
inclinação natural da inteligência e da atividade humanas, logo reduz a cousa o
termo e o próprio termo a seu significado comum. Também é verdade que a maioria
dos homens pensa mais "através" de idéia "confeccionada"
que por idéia estudada.
Assim,
Bergson teve que escolher uma palavra para qualificar esta exigência do esforço
intelectual e ficou definida a doutrina bergsoniana como
"intuicionista". Desde então, este "intuicionismo" foi
admirado ou criticado sem a preocupação exata com o que Bergson quis dizer com
esta palavra.
O
sentido de um termo se define quase sempre pelo uso que se faz dele, do mesmo
modo que o alcance de um método se manifesta, não pela definição que lhe é
dada, mas pelas aplicações que dele são feitas. É, portanto, contrário a todas
as regras da lógica e da razão fazer um juízo de um método intuitivo sem antes
ter estudado suas aplicações.
A
maioria define intuição como um processo místico, talvez irracional e até
anti-racional, e que escapa a todo controle. Reduzem, então, a intuição a algo
dependente da própria palavra que o designa e que é por eles tomada no seu
sentido ordinário. Vêem-na com um caráter de adivinhação instintiva, de
pressentimento vago, e sobretudo carente de razão definida. Semelhante
interpretação está muito longe da mente do verdadeiro investigador.
Nós
mesmos julgamos que se devem considerar as expressões de Bergson, pois não se
pode exigir que um filósofo conheça todas as ciências, nem que possua a fundo
alguma, embora se especialize nela, porque, em nossa época, o problema do uso
do tempo é como a quadratura do círculo. Mas é necessário que o filósofo seja
capaz de assimilar as ciências indispensáveis aos seus estudos, que esteja
atualizado, a fim de poder seguir aprofundando-se e chegar ao progresso correspondente.
E isto é impossível: Bergson o demonstrou e, pode-se afirmar, sem nenhum temor.
Este filósofo em sua filosofia se mostrou mais cientista que a maioria dos
cientistas. A intuição não evita o trabalho intelectual, ela o coroa, acaba e
aperfeiçoa; é a capacidade do que sabe, em ordem qualitativa. O diagnóstico do
médico, por exemplo, é uma intuição obtida lenta e laboriosamente, o que prova
que a intuição nem sempre precede nem evita a reflexão discursiva e o
pensamento analítico. A intuição, pois, encontra-se em estado natural nos
nossos pensamentos, e devemos preparar-nos para ela por uma lenta e
conscienciosa análise; familiarizamo-nos com todos os documentos que se refiram
ao objetivo do nosso estudo.
O
conhecimento científico e preciso dos fatos é a primordial condição da intuição
metafísica que penetra o princípio.
Já
não é no sentido de "pressentimento" que se há de compreender a
intuição, mas pela espontânea sensação, a compreensão imediata do fato
resultante de nossas investigações, o resultado rápido da interpretação de
nosso conhecimento.
O termo "acaso" é demasiado
fácil para fazê-lo intervir, pois uma hipótese não pode harmonizar com a
magnífica lei que afirma não haver efeitos sem causas, nem causas sem efeitos.
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